“Mesmo sem considerar emblemático o jogo conhecido das caixas japonesas, alojadas uma na outra até o vazio, podemos já ver uma verdadeira meditação semântica no menor pacote japonês. Geométrico, rigorosamente desenhado e no entanto assinado em algum lugar por uma dobra ou um laço assimétricos, pelo cuidado, pela própria técnica de sua confecção, a combinação do papelão, da madeira, do papel, das fitas, ele já não é o acessório passageiro do objeto transportado, mas torna-se ele mesmo objeto: o invólucro, em si, é consagrado como coisa preciosa, embora gratuita; o pacote é um pensamento; (…). Assim, a caixa brinca de signo: como invólucro, écran, máscara, ela vale por aquilo que esconde, protege e contudo designa; (…) como se a função do pacote não fosse a de proteger no espaço, mas a de adiar no tempo; é no invólucro que parece investido o trabalho da confecção (do fazer), mas exatamente por isso o objeto perde algo de sua existência, torna-se miragem: de invólucro a invólucro, o significado foge, e, quando finalmente o temos (há sempre qualquer coisinha no pacote), ele parece insignificante, irrisório, vil: o prazer foi experimentado: o pacote não é vazio mas esvaziado: encontrar o objeto que está no pacote, ou o significado que está no signo, é jogá-lo fora: o que os japoneses transportam, com uma energia formigante, são afinal signos vazios. Pois há, no Japão, uma profusão daquilo que poderíamos chamar de instrumentos de transporte; eles são de toda espécie, de todas as formas, de todas as substâncias: pacotes, bolsos, bolsas, malas, panos (o fujo: lenço ou xale camponês com que se embrulha a coisa), todo cidadão tem, na rua, uma trouxa qualquer, um signo vazio, energicamente protegido, apressadamente transportado…”